domingo, 22 de agosto de 2021

Gerenciamento de resultados por manipulação de “accruals” e por manipulação de despesas operacionais

 

Por Raimundo Aben Athar

 

Outro dia, em sala de aula, procedíamos a uma análise avançada das demonstrações contábeis de uma grande empresa, sociedade anônima de capital aberto, integrante do nível 1 do novo mercado da bolsa de valores brasileira. Naquelas peças contábeis dos últimos 5 anos, buscava-se detectar indícios de que houve gerenciamento de resultados.

Os objetivos da aula eram (1) desenvolver no alunado os conceitos de gerenciamento de resultados, por uso de “accruals” discricionários e também o gerenciamento de resultados, via manipulação de algumas despesas operacionais e (2) Apontar, o quão comprometedoras podem ser tais técnicas, as quais, efetivamente, alargam a assimetria informacional entre gestores e investidores e, óbvio, reduzem a qualidade da informação contábil para os demais stakeholders da empresa.

Claro deve estar que os resultados publicados por empresas brasileiras, com o uso de técnicas de gerenciamento de resultados, em sua maioria, encontram respaldo na legislação, posto que, tais legislações, permitem variações e interpretações diferenciadas nas formas de apropriações e reconhecimentos contábeis.

O objetivo aqui neste “paper” é apenas alertar o futuro bacharel em ciências contábeis e os atuais bacharéis, neófitos ou não no tema, sobre o dilema que poderão enfrentar ao optarem por apropriar um valor de despesa ou de receita, o qual, irá aumentar ou diminuir o resultado do exercício. Segundo Martinez[1] (2001, p.14) há inúmeras causas para gerenciamento de resultados contábeis, entre outros motivos, cita aquele autor:

  • O desejo de preservar o cargo, mesmo que implique comprometer a qualidades dos resultados contábeis apresentados;
  • A pressão dos acionistas por resultados trimestrais cada vez maiores e melhores, bem como o anseio de atrair novos investidores e acionistas;
  • A ambição de obter bônus significativos (compensação), ainda que isto implique sacrifício futuro da organização.

Mas, em verdade, o que é gerenciamento de resultados? Para Healy e Wahlen[2] (1999, p. 368), o gerenciamento de resultados ocorre quando os gestores usam do julgamento na elaboração dos relatórios financeiros e na estruturação das transações com o intuito de alterar os relatórios financeiros e não chamar, ou chamar, a atenção de alguns stakeholders sobre o desempenho econômico-financeiro da empresa ou para influenciar os resultados de eventuais contratos que dependem dos números contábeis divulgados.

Há duas formas de gerenciar resultados, uma delas se dá pelo uso de “accruals”[3] discricionários, ou seja, usa-se o reconhecimento, a apropriação, o lançamento contábil por “opção” e não por obrigação. Exemplo. Quando a empresa procede a uma venda em agosto, de determinado ano, para ser efetivamente recebida em setembro, o reconhecimento da receita se dá em agosto, pelo valor da transação, ou seja, é obrigatório (não discricionário) pelo regime de competência. Todavia, pode ou não haver uma provisão para crédito de liquidação duvidosa (PCLD) e o valor da provisão é eivado de subjetividades. Assim, a receita é um “accrual” não discricionário, diz-se que é um “accrual” positivo e a despesa com PCLD, um “accrual” negativo. Note que a decisão de criar a provisão e a decisão do valor da provisão irão impactar o resultado do exercício para mais ou para menos. Lembrando que em tradução livre a expressão inglesa “accrual” é reconhecida como “acumulação”

Uma das maneiras, bem simples, há modelos econométricos complexos, de identificarmos os valores dos “accruals”, em determinado período, é aplicamos a seguinte fórmula, prescrita, sugerida, por vasta literatura nacional e internacional sobre o assunto:

“ACCRUALS” = Lucro Líquido do Exercício – Fluxo de Caixa Operacional Líquido

            No “frigir dos ovos”, temos uma confrontação entre o regime de competência e o regime de Caixa. O valor da acumulação ou “accrual” do período precisa e deve ser investigado visando detectar possíveis tipos de uso de acumulações utilizadas por opção (discricionária), tanto no valor, quanto na tempestividade, daí podendo resultar o que se convencionou chamar de gerenciamento de resultados.

            Note que este tipo de gerenciamento de resultado, chamado de discricionário, tanto os órgãos reguladores, quanto as empresas de auditoria, podem encontrar “rastros” e solicitar alterações ao longo dos trabalhos ou informar nos relatórios específicos para os usuários da informação contábil. Mas o que dizer de outra forma de gerenciamento de resultado, bem mais sútil e mais difícil de ser detectado pelos órgãos reguladores e empresas de auditoria? Refiro-me ao gerenciamento de resultado, usando as despesas operacionais. Segundo vários autores, na literatura acadêmica sobre gerenciamento de resultado, o gerenciamento via manipulação de despesas operacionais é pouco discutido e também possui menos modelos econométricos, comparativamente ao gerenciamento de resultado via “acrruals” discriminatórios. Desnecessário lembrar que “gerenciar” resultado, em maior ou menor medida, irá afetar itens patrimoniais e, por consequência, índices de rentabilidade, liquidez, giro e estrutura serão afetados.

Conforme Paulo (2005 p. 23)[4], os administradores podem manipular as atividades operacionais durante o período, visando de atingir certas metas de desempenho. A manipulação das atividades operacionais vai depender da transação a ser delineada. Neste contexto, podem-se citar alguns tipos de manipulação:

  • Aumento das receitas pela aceleração do processo de vendas e/ou geração de vendas insustentáveis através de aumento dos descontos (temporários) sobre o preço ou diminuição das restrições de créditos aos clientes;
  • Diminuição das receitas pela postergação do envio de vendas já realizadas;
  • Redução dos custos dos produtos vendidos através do aumento dos níveis de produção (economia de escala), fazendo com que os resultados contábeis aumentem no período; e
  • Redução dos gastos com pesquisas e desenvolvimento, treinamento de pessoal, manutenção do parque fabril. Implementar descontos especiais ou incentivos para aumentar as vendas próximo ao fim do trimestre, investir em um novo equipamento, contratar empregado adicional; as empresas constantemente tomam esses tipos de decisões.

Segundo Cardoso e Martinez[5] (2006, p.8) essa manipulação às vezes é chamada de “gerenciamento econômico da informação contábil’ porque ela impacta o fluxo de caixa da entidade e, consequentemente, as receitas e as despesas associadas com essa atividade.

O objetivo aqui foi apenas apontar para o bacharel e o futuro bacharel sobre um tema que em breve irá dominar a literatura contábil brasileira: O gerenciamento de resultados e a responsabilidade social corporativa. Em recente trabalho publicado[6], sobre responsabilidade social corporativa e gerenciamento de resultados em empresas estatais chinesas, as pesquisas sugerem que as empresas socialmente responsáveis são menos propensas a realizar atividades de gerenciamento de resultados, isto porque podem ter um impacto negativo em suas respectivas reputações e também pelo fato de que os compromissos de responsabilidade social corporativa melhoram os perfis sociais das empresas e aumentam a reputação corporativa. Lembrando que a pesquisa ocorreu na China.

Fato é que no Ocidente ou no Oriente, as questões éticas, num futuro próximo, sem dúvida alguma, tenderão a prevalecer sobre os resultados, daí a importância, tanto para os futuros Contadores, quanto para todos os Contadores em atuação no Brasil.


[1] MARTINEZ, A. L. Gerenciamento dos resultados contábeis. Estudo empírico das companhias abertas brasileiras. 2001, 167 f. Tese (Doutorado em Controladoria e Contabilidade) - Universidade de São Paulo: São Paulo, 2001.

[2] HEALY, P. M. e WAHLEN, J. M. A Review of the Earnings Management Literature and itsImplications for Standart Setting. Accounting Horizons, v. 13, n. 4, p. 365-383, 1999.

[3]“A expressão “accruals” tem sido usada no sentido de provisões ou estimativas. Genericamente, representam os elementos do resultado que, embora pelo regime de caixa já tenham sido efetivados, ainda não se atribuem dentro do período de apuração ou do regime de competência. De acordo com Stickney e Weil (2001, p. 791), o termo “accrual” está relacionado ao reconhecimento de despesa ou receita e do correspondente passivo ou ativo, em decorrência de um evento contábil. A ocorrência do evento em exame não se relaciona com a entrada ou saída de caixa; por exemplo: no final de determinado período, reconhece-se uma receita ou despesa de juros, independentemente dos juros terem sido recebidos ou pagos” Fonte: https://www.scielo.br/j/rac/a/Smr9qZ7TbhcGjp36JrDQBmv/?lang=pt   - Acessado em 18.08.21

[4] PAULO, E. Manipulação das informações contábeis: uma analise teórica e empírica sobre osmodelos operacionais de detecção de gerenciamento de resultados. 2007. Tese(Doutorado em Controladoria e Contabilidade) - Universidade de São Paulo: São Paulo,2007.

[5] CARDOSO, R. L. e MARTINEZ, A. L. Gerenciamento de resultados contábeis no Brasilmediante decisões operacionais. In: ENANPAD, 30., 2006, Salvador/BA. Anais... Rio deJaneiro: ANPAD, 2006.

[6] Are Socially Responsible Companies Really Ethical? The Moderating Role of State-Owned Enterprises: Evidence from China. By: Chen, Xiangyu; Safdar Sial, Muhammad; Tran, Dang Khoa; Alhaddad, Waseem; Hwang, Jinsoo; Thu, Phung Anh. Sustainability (2071-1050). Apr2020, Vol. 12 Issue 7, p2858.

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

HÁ DIFERENÇA ENTRE A POLÍTICA CLASSISTA E POLÍTICA PARTIDÁRIA EM ÉPOCA QUE ANTECEDE AS ELEIÇÕES?

Por Raimundo Aben Athar

Parece haver diferença entre política partidária e política classista, principalmente em época que antecede as eleições e é proibida a campanha eleitoral, mas não há. Não há diferença alguma.

Notem que políticos no poder, partidários ou classistas, usam e abusam da visibilidade que a máquina administrativa pode proporcionar e, óbvio, dos recursos da população ou da respectiva classe.

Quem já está no poder, afirma com a "cara mais lavada possível": “Não, não estou usando a máquina, estou trabalhando pelo povo" ou... "pela classe”.

Já perceberam como, nesta época, há “lives” e mais “lives”? Refiro-me a "lives" com a chancela, ambiente virtual e logotipo, dos respectivos conselhos, partidos, governos etc. E quem são os palestrantes e mediadores? Sim, em maioria, os futuros candidatos, não por acaso, no caso dos classistas, já são conselheiros e candidatos a conselheiros. Alguns políticos possuem ou têm domínio sobre rádios difusoras, alguns políticos classistas também... Alguma diferença? Nenhuma.

Fazem cartazes lindos e publicam em todas as redes sociais, tais cartazes, na verdade, são os famosos “santinhos” em época de eleição. Realmente, não se sentem intimidados. Para quem está no poder, é tudo normal, é tudo na forma da lei. Mas... será ético?

Querem saber mais? Antes das eleições, há uma farta distribuição de medalhas e moções, ou seja, algo que deveria ser uma distinção, passa a ser uma espécie de prêmio comum para os amigos de ocasião e, na maioria dos casos, eleitores e influenciadores de votos.

Convocam eventos, que não fizeram nos anos anteriores, com os próceres do grupo, partido ou da dinastia que representa o poder. Fazem caravanas para o interior dos estados em eventos presenciais, discutíveis na essência, na tempestividade e na forma.

Na verdade, seja em eleições partidárias ou em eleições classistas, quem elege os candidatos é quem NÃO vota, pois os eleitores de cada político e de cada grupo classista, votam sempre e revovam o voto em cada eleição, seja pela amizade, seja pela defesa de privilégios, seja pelo possibilidade de um espaço criado para futuros negócios, seja pela visibilidade proporcionada...

Vejam mais: No caso de eleições partidárias, quem está devendo, por exemplo, o tributo Imposto de Renda ou Imposto Predial, ou até mesmo com o cadastro negativado, pode votar normalmente, mas no caso dos classistas, quem está devendo o tributo, chamado de "anuidade", não pode votar. E assim, uma parte não vota porque não vê motivo, outra parte vota em branco ou nulo e pronto ganha as eleições os mesmos porque são os mesmos que votam. Simples assim.

Major Quaresma, no início do século XX, não era louco. Que o diga, o genial Lima Barreto. Leiam novamente “O triste fim de Policarpo Quaresma" 

sábado, 3 de julho de 2021

Onde está o equilíbrio orçamentário em se promover arrecadações em excesso e direcionadas para o mercado financeiro? O caso do sistema CFC/CRC(s).

 Por Raimundo Aben Athar


Do valor total da anuidade, cobrada dos profissionais da Contabilidade e dos Escritórios de Contabilidade, 80% permanece no Conselho Regional de Contabilidade - CRC(s) do estado onde foi arrecadada e 20% são imediatamente remetidos para Brasília, para o Conselho Federal de Contabilidade - CFC. 

Ao longo de anos, mesmo os CRC(s) operando com 80% do que arrecadam, e o CFC, com os 20% restantes, todos os 27 CRC(s) do Brasil e o CFC, obtêm expressivos superávits orçamentários e, ano a ano, como os recursos não são direcionados para a classe contábil, surgem, em primeiro lugar, as "sobras orçamentárias", com o pomposo nome de superávits de execução, cujos totais, em segundo lugar,  vão "parar", em vultosas aplicações financeiras de curto prazo, junto a bancos do governo.

O quadro 1, a seguir, ilustra, desde 2014 até 2020, a evolução da arrecadação dos seis maiores CRC(s). São seis estados que concentram 82,77% de todos os profissionais da Contabilidade, registrados no Brasil (dados de 2020). Os valores arrecadados, pelos seis maiores CRC(s), representam 67% do total arrecadado com as anuidades de profissionais e das empresas contábeis. Quer dizer, a maioria, ou 21 CRC(s), arrecadam 33% do orçamento do sistema CFC/CRC(s) e representam apenas 17,23% de todos os profissionais registrados em 2020 no Conselho Federal de Contabilidade. Com mais uma curiosidade, não menos significativa, o estado de São Paulo, sozinho, registra quase 30% dos profissionais da Contabilidade de todo o Brasil e entre 2019 e 2020, no total, São Paulo remeteu para o CFC a quantia aproximada de R$ 31,2 milhões.

          Quadro 1


 O quadro 2, a seguir, é bastante esclarecedor, no que concerne à conclusão sobre excesso de valor embutido na anuidade cobrada da classe contábil. A análise é muito óbvia, os superávits recorrentes, aplicados no mercado financeiro e não com a classe contábil, sugerem, como veremos ao longo deste trabalho, anuidades que elevam as receitas em proporções que permitem sobras. 

O valor médio aplicado mensalmente pelo CFC e os seis maiores CRC(s) em arrecadação, por exemplo, em 2019 e 2020, enfatizo, mensalmente, foram de R$ 295,7 milhões e R$ 349,1 milhões respectivamente.

            Quadro 2


O principal motivo para haver vultosas aplicações no mercado financeiro, decorre da condição de que os conselhos regionais e o conselho federal de Contabilidade, ao longo de anos, apresentam vultosos superávits de execução nos seus respectivos orçamentos, contudo, tais excessos não são destinados ou consumidos com a classe contábil, visando principalmente o cumprimento das atribuições legais estabelecidas no artigo 10 da lei 9295 de 1947, em especial a alínea "c" daquele artigo, que trata da principal atribuição dos conselhos de contabilidade ou seja, fiscalizar o exercício da profissão contábil, impedir e punir as infrações e enviar para as autoridades competentes documentação sobre os fatos apurados e cuja solução não seja da alçada dos conselhos. Tais "sobras orçamentárias" são direcionadas para o mercado financeiro.

É consenso, em administração pública que os superávits correntes, propiciam muitas oportunidades de consumo de recursos, por exemplo, em gastos de capital (investimentos e inversões financeiras), todavia, se tais gastos de capital, ao longo dos anos, tivessem realmente ocorrido, a taxa de crescimento das aplicações financeiras, incluídas na rubrica Caixa e Equivalentes dos demonstrativos contábeis, por exemplo do CFC, quadro 3 a seguir, seria infinitamente menor que as taxas de crescimento dos superávits totais de execução, no período de 2010 a 2020.

Quando comparamos a evolução dos valores dos superávits de execução e os valores abrigados na rubrica "Caixa e Equivalentes" (em suprema maioria, aplicações financeiras), nota-se que tal rubrica Caixa e Equivalentes se eleva anualmente em 19,7%, desde 2010 até 2020 (quadro 3). No mesmo período, a formação de superávits de execução se eleva, também anualmente em 14,2%. 

A elevação anual do superávit de execução, "engorda" as aplicações financeiras de cada ano e assim ano a ano vai sendo realimentada pelos valores do "novo" superávit. Dessa forma, de superávit em superávit, aplicado no mercado financeiro, chegou-se ao ano de 2020, o ano da pandemia, com R$ 116,0 milhões de Caixa e Equivalentes em 31.12, tendo aplicado o CFC no mercado financeiro, em média, em cada mês do ano de 2020, o valor de R$ 95,5 milhões. Vê-se, de forma cabal, portanto, que o “destino” dos superávits orçamentários realmente não é a classe contábil.

   Quadro 3


Os superávits de execução corrente, podem ser oriundos ou de excesso de arrecadação ou de economia orçamentária. A economia orçamentária possui alguns limites operacionais e temporais, devido à estabilidade e perenidade de algumas despesas, há, portanto, um limite para as operações não sofrerem solução de continuidade. A principal dessas despesas, é a despesa com pessoal (salários, encargos e benefícios), mas também os demais custeios. Na linha do tempo, atingido tais limites, a economia orçamentária tenderá a não obter mais valores significativos.

Se não é a economia orçamentária, o motivo dos superávits, não resta dúvida, é o excesso de arrecadação. Os valores dos superávits correntes de execução são realmente bastante significativos, sendo estes superávits, como já afirmamos, os motivos para as aplicações de recursos no mercado financeiro. 

Os quadros 4 e 5, a seguir, deixam claro, a relevância dos valores excedidos na execução corrente orçamentária. Vejamos o que ocorreu somente nos anos de 2019 e 2020, nos 27 CRC(s) e no CFC.

Quadro 4

No CFC, o superávit de execução é assim demonstrado:

Quadro 5


Notem que, dos R$ 293,7 milhões arrecadados em 2019, pelos 27 CRCs, R$ 32,6 milhões compuseram o superávit corrente de execução. Em 2020, dos R$ 261,2 milhões arrecadados, pelos 27 CRC(s), R$ 30,2 milhões foram reconhecidos como superávit corrente de execução.

Vimos que 20% da arrecadação dos 27 CRC(s), segundo as normas atuais, é levada para o CFC, sendo que tais 20% são tecnicamente chamados de “cota-parte” e consistem na principal receita do conselho federal. Sendo importante lembrar que os superávits apurados nos CRC(s) já consideram a remessa da chamada “cota-parte” para compor as receitas do CFC.

Somados, CRC(s) + CFC, os superávits correntes de execução, em 2019 e 2020, importam em R$ 50,3 milhões e R$ 48,0 milhões respectivamente. 

Bem, havendo excesso de arrecadação, haverá a geração de superávit corrente, o qual poderá gerar investimentos e inversões financeiras no sistema. 

As aplicações financeiras em valores tão significativos, não nos permitem concluir que esteja havendo despesas de capital em valores expressivos. Há, isto sim, em valores significativos, alguns empréstimos efetuados pelo CFC para os CRC(s) para, por exemplo, construção de sedes, entretanto, não devem ser considerados inversões financeiras, são, na verdade, um jogo de soma zero, ou quase isso, pois os empréstimos são despesas de capital no CFC e receitas de capital nos CRC. Quando os juros e o principal são pagos pelos CRC(s), há despesas de capital nos CRC(s) e receitas de capital no CFC. Claramente, um jogo de praticamente soma zero, pois os juros são receitas correntes.

É preciso enfatizar e esclarecer que as despesas do CFC, abrigadas em “transferências de capital”, estas sim, produziriam um resultado positivo, em termos efetivos, nos CRC(s). 

O argumento de que a anuidade está elevada, é direto e objetivo. A lógica é linear: Há sobras não aplicadas, mesmo operando, como já enfatizamos, os CRC(s) com 80% do que arrecadam e ainda assim, há aplicações de grande valor no mercado financeiro.

Onde está o equilíbrio orçamentário em se promover arrecadações em excesso e direcionadas para o mercado financeiro?

A solução do problema, do excesso de arrecadação e anuidades elevadas, passa pela redução do valor da anuidade, contudo, será necessário um período, talvez de duas administrações, para haver um reagrupamento, um realinhamento de receitas e despesas, ano a ano por parte de todo o sistema CFC/CRC(s). 

A arrecadação elevada, além de proporcionar "sobras" em aplicações financeiras, proporciona também excessos nas despesas com pessoal, vejam o exemplo, no Conselho Regional do estado do Rio de Janeiro – CRCRJ, as despesas com pessoal representaram, em 2020, exatamente 73,0% da arrecadação, pelo critério mais conservador, logo relativamente, de cada R$ 1,00, arrecadado no CRCRJ, sobram somente R$ 0,27 para aplicar com a classe contábil. Ainda assim, o CRCRJ manteve aplicado mensalmente em média, no ano de 2020, o ano da pandemia, o valor de R$ 11,9 milhões. 

É bom que todos os CRC(s) façam essa mesma conta, porque em algum momento, esta situação pode se tornar insustentável e repercutir em toda a classe contábil.

terça-feira, 29 de junho de 2021

As aplicações financeiras do sistema CFC/CRC nos anos de 2019 e 2020.

 



Por Raimundo Aben Athar

Em 2019 e 2020, os valores dos superávits correntes de execução dos 27 CRCs e CFC são bastante expressivos, sendo estes superávits os motivos para as, não menos expressivas, aplicações de recursos no mercado financeiro por parte daquelas entidades. Simples, como os recursos não são direcionados para a classe contábil, as sobras, vão para o mercado financeiro.

            Notem o quadro 1, dos R$ 293,7 milhões arrecadados em 2019, pelos 27 CRCs, R$ 32,6 milhões foram para o mercado financeiro.

Em 2020, dos R$ 261,2 milhões arrecadados, R$ 30,2 milhões “sobraram” e também foram parar no mercado financeiro.

Estamos “falando” de um excesso de arrecadação, cobradas dos profissionais da Contabilidade, pelos 27 CRCs, sobre as despesas efetivadas em cada unidade. Vejamos:

Quadro 1



         Não esqueçam: 20% da arrecadação dos CRC(s) é remetida “limpinha” para o CFC. Assim, mesmo os CRC(s), operando com 80% do que arrecadam, estes conseguem os expressivos superávits de execução demonstrados e, por consequência, as vultosas médias mensais de aplicações financeiras.

         No CFC, o superávit de execução é assim demonstrado:

        Quadro 2


Bem, cabe a seguinte indagação: O que vultosos superávits tendem a provocar ao longo de repetidos anos? Isso mesmo! um volume expressivo de aplicações financeiras mensais, levadas ano a ano ao mercado financeiro e não consumidas/direcionadas para e com a classe contábil.

O quadro 3, a seguir, é esclarecedor e devastador no que concerne à conclusão do quão elevada é a anuidade paga pela classe contábil brasileira. Em 2019, foram aplicados no mercado financeiro, em média, mensalmente, pelos 6 maiores CRC(s) em arrecadação e pelo CFC, o valor de R$ 295,7 milhões e, em 2020, o valor de R$ 349,1 milhões.

Muitos colegas não “entendem” estes números, dividem por doze meses o valor, por exemplo, de R$ 349,1 milhões e “acham” que a aplicação mensal média foi de R$ 29,09 milhões (349,1/12). Não!!! Mil vezes não, o valor médio aplicado mensalmente pelo sistema CFC/CRC(s) foi de R$ 349,1 milhões.

Quadro 3

Visitem os portais da transparência dos CRCs e do CFC, tenho certeza, vocês vão se espantar com tanta “sobra” e pior, com o destino dado a tais sobras (tão somente o mercado financeiro).

Os CRC(s) dos estados de Minas Gerais, Paraná e São Paulo, concentraram em 2020, mensalmente, fruto dos constantes superávits, obtidos nos anos anteriores, a fabulosa quantia média de R$ 228,7 milhões, ou 88% de tudo que os 27 CRC(s) arrecadaram no mesmo ano de 2020. 

Lembram dos anos sem pandemia? Vou lembrá-los de um acordão do TCU de 2014:

GRUPO II – CLASSE VII – PLENÁRIO

TC 027.851/2014-1

Adoto, como relatório, a instrução elaborada pela Secex Trabalho (peças 105/107)

“Trata-se de denúncia, autuada em 10/10/2014, referente a possíveis irregularidades ocorridas no Conselho Federal de Contabilidade (CFC), relativas a participação de delegações em eventos no exterior, pagamento de diárias, custeio de passagens em classe executiva, custeio de despesas de viagens de ex-Presidentes, pagamento de meia-diária a residentes no mesmo local de realização de reuniões de trabalho, ausência de comprovação de aquisição de passagens aéreas pelo menor preço, contratação direta da Fundação Brasileira de Contabilidade (FBC) e celebração de convênio com a FBC. (grifei)

           Isso mesmo, com o fim da pandemia, poderá voltar o excesso de diárias e passagens. Visitem agora os portais da transparência de cada CRC e CFC e vejam como os valores para diárias, passagens e locomoções diminuíram de forma vertiginosa. Eu indago: Os CRCs e CFC pararam de funcionar? Cessaram suas obrigações institucionais? Evidente que não.

         Vê-se, de forma indubitável, que a anuidade cobrada é elevada, pois mesmo os 27 CRC(s) remetendo 20% do que se arrecada ao CFC, ainda assim, foram produzidos superávits significativos no conjunto e individualmente.

         Uma derradeira observação, que bem mostra o que parece ser uma aplicação de recursos desigual, posto que se reveste de questões e direcionamentos que retiram recursos de forma desproporcional de uma unidade da federação (CRC) e os recursos são aplicados em outra unidade da federação (outro CRC). Vejamos:

Em 30.06.2021, pela terceira vez, (grifei) tomara que desta vez, não seja retirado, entrará em pauta no Tribunal de Contas da União - TCU um processo de conformidade/legalidade sobre os empréstimos, com juros, efetuados pelo CFC ao CRC do estado do Rio Grande do Sul, no valor total de R$ 13,5 milhões, obtidos entre 2018 e 2019 em duas tranches uma de R$ 6,0 milhões e outra de R$ 7,5 milhões respectivamente, para a construção de uma nova sede, sendo que a antiga sede está reconhecida e registrada como previsão de alienação em 2021, no valor de R$ 16,6 milhões.

Empréstimos a juros, são efetuados normalmente pelo CFC. Diversos CRC(s) da federação já foram beneficiados, o CRC do estado do Maranhão, por exemplo, recebeu um empréstimo, também para construção de sede, entre 2014 e 2015, no valor de R$ 2,1 milhões, sempre com juros. O interessante é que o valor do empréstimo, à época, representava cerca de 71,2% da receita corrente do CRCMA.

         Fato é que o art. 35 da Lei de Responsabilidade Fiscal poderá ser invocado e a transação sofrer algum tipo de restrição.

         Todos os CRCR(s) enviam 20% do arrecadam para o CFC, seria interessante também o CFC divulgar qual o critério adotado para alguns CRC(s) “merecerem” o empréstimo e outros não, já que todos contribuem, literalmente, com seu quinhão.

Voltando aos valores aplicados, é difícil acreditar que há colegas que defendem as aplicações no mercado financeiro e não as aplicações de recursos com a classe contábil.

Por que será que há colegas, profissionais da Contabilidade, que defendem isso? Por que será que a classe contábil não toma partido, exigindo uma mudança radical de comportamento?

         Parece difícil de acreditar que, para números tão significativos, como os números aqui demonstrados, a classe contábil brasileira, não dá a menor importância e, pior, a cada eleição, seja de 1/3 ou de 2/3 do plenário, elege o mesmo grupo de pessoas para representá-la e tudo “continua como dantes no quartel de Abrantes”.


quinta-feira, 3 de junho de 2021

A CABERJ, A ANS E O FIM DO PLAEF DE DEZEMBRO DE 2017

Por Raimundo Aben Athar    

Que “linda” mensagem da diretoria da Caberj... Desde dezembro de 2017, sob as rédeas, sob a tutela, sob a égide de um regime imposto pela ANS, chamado PLAEF, fruto do descaso e da incompetência com os recursos de todos os velhinhos da Caberj, pois muito bem, essa a mesma diretoria que causou tantos prejuízos e tantas preocupações a todos nós (não deixem de ler com bastante atenção a tabela 1, a seguir) com contratos com a prefeitura do Rio e pagamentos de comissões e de assessoramentos de valores altíssimos e que geraram demandas judiciais também de valores elevadíssimos, vem essa mesma diretoria e louva a saída da ANS e se louva como competente.

Não se iludam!!! sem a ANS estaríamos, todos nós velhinhos, hoje em outras operadoras e gostaria de “ver” nas outras operadoras, se o paciente tem a chance de ligar diretamente para a diretoria, pedindo um auxílio pela demora em ser internado. Isso acontece? Ah! Como deve ser adorável diretorias de empresas, operadoras de saúde, que ligam para alguns pacientes, indagando sobre a saúde do internado. Resta saber se é preocupação com o internado ou a preocupação é com o voto do internado? Posto que, vivo, o internado recuperado, além do voto, será um fervoroso defensor de tal diretoria e passará a ter uma “diretoria e um diretor de estimação" para chamar de seu.

Ah! senhores diretores do grupo CABERJ, os senhores deviam, em primeiro lugar, pedir desculpas a todos nós por terem causado tantos transtornos. Deveriam pedir desculpas pelo que fizeram e que, se não fosse o regime especial imposto pela ANS, estaríamos todos amargando o fim da nossa Caberj. Notem a tabela 1, a seguir, e vejam se alguém pode se orgulhar daqueles resultados. Eu lembro, estávamos no PLAEF, desde dezembro de 2017.             Agora, reparem: Que interessante, desde 2013, somente em 2015, quando os efeitos do contrato da prefeitura ainda não haviam aflorado, só temos prejuízos (cor vermelha), após o PLAEF, imposto pela ANS, somente lucros. Indago: Quem merece aplausos? A ANS ou a tal Diretoria?

                        Tabela 1

Reparem mais a tabela 1: Desde 2013 até 2020, em valores nominais, portanto, sem correção alguma, “perdemos” de patrimônio social da Caberj dos velhinhos cerca de R$ 48,5 milhões. É para comemorarmos isso?

         Vejam os “lucrinhos” da Integral, que não compensam o prejuízo de 2016, e que todos saibam: o patrimônio social da Integral foi totalmente integralizado pela Caberj dos velhinhos. Corrijam os valores pelo IGP-M e constatem quantos anos “faltam para voltarmos” a 2013.

Já escrevi e vou repetir: Sou 100% a favor da CABERJ, claro, todos nós devemos ser 100% CABERJ, mas não aplaudo e não louvo  incompetência. 

Lembro mais: foram R$ 32,1 milhões da Caberj dos velhinhos, direcionados, ao longo dos anos, para a CABERJ INTEGRAL. Mais ainda: recorrentes empréstimos e vendas de ativos direcionados para a CABERJ INTEGRAL. Eu vou, mais uma vez, lembrar a todos vocês: a CABERJ dos velhinhos, mesmo sob um PLAEF, tomou recursos emprestados num grande banco para aumentar o capital social da CABERJ INTEGRAL. Registre-se: Ato societário, juridicamente perfeito e acabado.

Parece que todos os “crentes” e “convertidos” esqueceram que, ao longo dos últimos anos, a “Caberj dos velhinhos”, insisto, despejou R$ 32,1 milhões na INTEGRAL e, até 31.12.2020, já haviam “evaporados” exatos  R$ 6,0 milhões daqueles R$ 32,1 milhões.

Parabéns ANS!!! Obrigado por me devolver a CABERJ.  Não tenho NADA a agradecer a quem provocou tudo isso. Sou tão Caberjiano, quanto qualquer um, somente não me iludo com discursos eminentemente políticos e eivados de meias verdades.

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Ouro de tolo e a CABERJ

 

Por Raimundo Aben Athar

Na política, é comum alguns brasileiros possuírem políticos de estimação e, por mais que se aponte um problema aqui e ali, nada demove o cidadão de continuar adorando o seu político de estimação. Na Caberj, não é diferente, há diretores de estimação e qualquer um que ouse apontar problemas na Caberj, é logo identificado como inimigo mortal da Caberj e, claro, do diretor adorado. Há pessoas na política que usam antolhos e, portanto, não conseguem ver o óbvio. Na Caberj, não é diferente. 

Tudo do que iremos ler a seguir pode ser pesquisado, levantado e constatado por intermédio das peças contábeis e respectivas notas explicativas publicadas pela Caberj.

Não há dúvida, a Caberj foi dilapidada, vítima dos efeitos de um malfadado contrato e esta sendo reconstruída, mais por uma lupa da ANS do que por estratégia.  Os velhinhos da CABERJ estão morrendo e deixarão um legado, a CABERJ INTEGRAL, esta sim, a menina dos olhos da atual administração.

Tudo na atual administração da Caberj, desde o famigerado contrato com a prefeitura do Rio, nos apavora. Creiam, ainda há motivos para esse medo. Graças a Deus, estamos sendo guiados por regras da autoridade regulatória, a ANS, e esta condição, nos permite, no que nos resta de tempo de vida, um alento de sermos assistidos, sem sobressaltos.

A mesma administração que assinou um contrato com a prefeitura é a mesma administração que já pagou, desde 2015, aproximadamente, R$ 22,0 milhões de comissões e assessoramentos referentes a corretagem do contrato com a prefeitura do Rio. 

Fora os R$ 22,0 milhões já pagos, em 2020, a Caberj pagou, em processos judiciais e em serviços de terceiros, o valor total de R$ 33,9 milhões e há ainda mais R$ 18,0 milhões “separados” para pagamentos em datas futuras. A figura 1, abaixo, é parte da Demonstração do Fluxo de Caixa, publicado pela Caberj, e corrobora nossa argumentação

           Figura 1

                        Fonte: CABERJ

Não se iludam, em verdade, as únicas pessoas que estão pagando por isso, somos nós mesmos, posto que, nenhum dos diretores foi responsabilizado (ainda!) pelo contrato que o grupo Caberj pactuou com a prefeitura do Rio de Janeiro.

Reavivando a memória de todos nós, velhinhos da Caberj: A Caberj Integral “ganhou” o chamamento público da Prefeitura do Rio de Janeiro mas, na hora de assinar o contrato com a prefeitura, foi a Caberj, que chamo de Caberj dos velhinhos, sem alguma conotação pejorativa, é porque somos velhinhos mesmos, foi quem levou o "prêmio" daquele fatídico contrato e assumiu todas as obrigações inerentes ao mesmo, inclusive os pagamentos de vultosas comissões e assessoramentos, as quais, uma parte daqueles pagamentos, foram publicadas com o título de "Execução Provisória" nas mídias sociais recentemente, Um dos efeitos daquele contrato com a prefeitura foi a “intervenção branca” que a Caberj foi obrigada a sofrer pela ANS. Triste sina essa a nossa de Banerjianos, de sofrermos muitas intervenções em nossas vidas.

Todos nós recebemos um aviso do CODEL atual, enaltecendo a atual administração e entre loas e vivas, esqueceu o Codel e seus representantes de dizer que entre 2016 e 2017, o grupo CABERJ (Integral e Velhinhos) amargou sucessivos prejuízos, os quais, sem correção alguma,  atingem R$ 120,5 milhões. Ora, estatisticamente, é fácil dizer que, quem estava tão embaixo, qualquer pequena subida, produz um efeito estrondoso. Foi o que aconteceu. Outro motivo, em menor escala, foi o regulador permitir em 2020, algumas flexibilizações.

Qualquer melhora é bem vinda, porém, antes de apresentarmos alguns motivos para a melhora, relembremos que, para capitalizar a Caberj Integral, a Caberj dos velhinhos já repassou aproximadamente, R$ 28,0 milhões, desde 2014 (vide minhas publicações anteriores).

O principal motivo para a Caberj dos Velhinhos ter apresentado um resultado positivo de R$ 34,0 milhões é bem fácil de explicar. A figura 2 abaixo, ilustra parte da Demonstração do Resultado da Caberj dos Velhinhos, entre 2019 e 2020, notem a redução significativa das despesas médicas que saem de R$ 213,4 milhões em 2019 e atinge em 2020, R$ 177,3 milhões, portanto, uma redução significativa de quase 17%. 

A redução de despesas médicas pode ser vislumbrada, conforme figura 2, a seguir, que reproduz a DRE publicada pela Caberj:

                                       Figura 2

                                               Fonte: CABERJ
        

Notem que a redução das despesas médicas, se deu em 2020, (o primeiro ano da pandemia). Ocorre que o senso comum nos leva a crer que as internações, exames e terapias tenderiam a aumentar, não só por conta da Covid, mas porque nossa faixa etária vai aumentando e assim, mais médicos, mais internações, mais exames, mais terapias, contudo, quem de nós, em 2020, quis se operar, se internar, fazer exames, terapias, sair às ruas? Está aí, o principal motivo para os exames diminuíram 39,3%, as terapias diminuíram, 17,8% e as internações 9,7%. Estes três tipos de despesas médicas representam 88% do total das despesas médicas. Bem está explicado a redução na rubrica “eventos indenizáveis líquidos”. Nada há aqui nada que mereça louvar a diretoria da Caberj. Estávamos no "piso" e fomos ao "teto" por nós mesmos e por um efeito estatístico. Mas não é isso que diz o informe nº 7 do Codel da Caberj...

A redução das despesas médicas foi, sem dúvida, a condição indutora para o excelente resultado da Caberj e tal fato foi explorado pelo Codel, contudo, referido Codel, no informe 7, não explorou o aumento vertiginoso das despesas administrativas. Tais despesas, saíram em 2019 de R$ 47,6 milhões para R$ 74,6 milhões em 2020. Ou seja, uma variação de 56,7% no ano.  A figura 1 nos mostrou parte do caminho, a figura 3, a seguir, complementa aquele caminho.

                            Figura 3

                                          Fonte: CABERJ - Parte da DRE - 2019/2020 - Notas Explicativas

As despesas administrativas, na Demonstração do Resultado, são reconhecidas por competência e não pelo efeito Caixa, mas são substantivas e, na maior parte, referem-se ao pagamento da sentença que todos nós tomamos conhecimento nas mídias sociais. Não se iludam, há mais por vir. Claro, leiam a sentença na íntegra. O processo é público.

Sobre os R$ 18,4 milhões, há possibilidade de que seja parte do pagamento da ação judicial, porém, para os “serviços de terceiros”, que foram pagos quase R$ 27,0 milhões (figura 1), não há notas explicativas sobre este pagamento. 

Acabou?  Não, não acabou, a Caberj esperar pagar, nos próximos anos, mais de R$ 20,5 milhões. Vejamos as figuras 4 e 5:

Figura 4

       Figura 5

Aos adoradores dos “diretores de estimação”, sinto muito dizer, mas a Caberj, em 2020, não melhorou por eficácia, eficiência e efetividade de seus administradores, melhorou por nossa decisão de suspender exames, internações e terapias e por algumas regras flexibilizadas pela autoridade reguladora. Nesta ordem. O efeito foi uma redução significativa dos eventos indenizáveis líquidos, os quais, parecem não escapar da lupa da ANS. Somos uma atividade absolutamente regulada ainda sob um regime especial de administração e que, após o “tombo” com a Prefeitura do Rio, como diz a máxima popular: prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. 

Conhecem a magistral composição (letra e música) do inesquecível Raul Seixas, chamada “Ouro de Tolo”? Pois é... As peças contábeis da CABERJ, me fizeram lembrar muito dessa música...

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Por que os spreads bancários no Brasil são tão elevados?

 

Por Raimundo Aben Athar

Sabemos que spread bancário é a diferença entre as taxas de captação (banco “pagando” para ter os recursos) e as taxas de aplicação (banco “recebendo” por usar os recursos). O spread bancário indica, de forma muito elementar, a diferença entre o preço de “compra” do dinheiro e o preço de “venda” deste mesmo dinheiro.

Uma comparação internacional feita em artigo de 2019, assinado pelos economistas Vitor Vidal, da LCA Consultores, e Marcel Balassiano, do Ibre/FGV, aponta que, ao mesmo tempo em que tem o segundo maior spread bancário do mundo (atrás apenas de Madagáscar), o Brasil está entre os piores países em termos de recuperação judicial de crédito. No Japão, por exemplo, país com o menor spread do mundo, são recuperados US$ 0,92 para cada US$ 1 emprestados. No Brasil, são recuperados, apenas US$ 0,11 para cada US$ 1 emprestado. Detalhe, a média mundial está em US$ 0,34 por US$ 1 emprestado.

Claro deve estar que essa ínfima recuperação do crédito concedido, impacta diretamente em vários custos que devem ser suportados pelos bancos, para a decisão de implementar uma operação de crédito, na condição de credor.

Uma das questões determinantes na formação dos custos para emprestar, é a estrutura de captação dos bancos e quanto eles, os bancos, estão pagando por tais estruturas, por exemplo, grandes bancos, devido á capilaridade, tendem a concentrar volumes de depósitos à vista, a prazo e de poupança muito superior aos bancos médios e pequenos. Outro fator, não menos importante, é a concentração bancária, para se ter uma ideia, os cinco maiores bancos brasileiros, por ativo, concentram 83,2% do mercado e 84,6% das operações de crédito no país[1]. A figura 1, abaixo, nos ajuda a entender o quão determinante para a formação das taxas de juros e dos spreads elevados é essa concentração bancária. Vejamos:

Figura 1

Fonte: https://insights.liga.ventures/open-banking/o-cenario-de-concentracao-bancaria-no-brasil/ Acessado em 07.05.2021

Além da concentração bancária, há vários outros motivos para os altos spreads brasileiros. Vejamos alguns:

a)        Dívida Pública Interna Alta:

·         Que incentiva a poupança financeira e desestimula a poupança produtiva;

·         Que eleva o prêmio pelo risco dos empréstimos;

b)        Níveis elevados de compulsórios:

·         Depósitos à Vista:                                      21%

·         Depósitos a Prazo:                                     31%

·         Depósitos de Poupança Livre e Rural    20%

c)         Níveis elevados de impostos:

·         PIS – 1,65%, COFINS – 7,6%

·         IR – 15% + 10%(adicional), CSSL – 9%

·         FGC = 0,025% sobre DAV, DPZO e DPOUP (Fundo Garantidor de Crédito)

d)        Créditos Direcionados

·         Financiamentos Rurais:                30% dos DAV(s)

·         Financiamentos. Imobiliários:       65% dos DPOUP(s)

·         Microcrédito:                                    2% dos DAV(s)

De acordo com o Banco Central, a diferença entre a taxa média cobrada nos empréstimos e a taxa de captação dos recursos, até out/2020, estava em 21,5pp. Vejamos a figura 2:

Figura 2

                                                      Fonte : www.bcb.gov.br – Acessado em 07.05.2021

A grande questão agora é explicar o porquê daqueles 21,5% de diferença entre as taxas de aplicação e as taxas de captação dos bancos brasileiros. Vejamos o quadro 1:

Quadro 1

Discriminação

Em proporção do spread

Custos Administrativos

0,8%

Inadimplência

41,3%

Compulsórios/Direcionamentos

2,3%

Impostos Indiretos e FGC

3,5%

Impostos diretos

20,4%

Margem de Lucro

31,7%

Total Spread

100%

Fonte: www.bcb.gov.br , www.abbc.org.br , www.febraban.org.br – sítios acessados em 07.05.2021

Em 2015, estudo da FIESP, aponta que o Brasil possuía um spread bancário 16,4 vezes maior que os seis países que usam o mesmo critério, adotado pelo Brasil, de composição para determinação do spread. A figura 3, a seguir. deixa claro a disparidade de taxas entre o Brasil e países como Itália, Nova Zelândia, Chile, Suécia, Malásia e Japão.


Há um longo caminho ainda a ser percorrido para que tenhamos um spread comparável ao primeiro mundo, porém, percebe-se claramente a redução significativa do spread bancário brasileiro entre 2015 e o ano de 2020, que diminui de 31,3 pp para 21,5pp., sem dúvida uma evolução, mas, como enfatizamos, ainda há muito a percorrer na diminuição dos impostos diretos e diretos, nos créditos direcionados, na inadimplência, na segurança jurídica para os bancos emprestarem, na concentração bancária, na definição da margem de lucro e nos recolhimentos compulsórios.

Para finalizar, vale ressaltar: A Contabilidade Bancária, é determinante para apuração e entendimento dessa importante variável da economia, que é o spread bancário.


[1] www.bcb.gov.br – Acessado em 07.05.2021