quarta-feira, 12 de maio de 2021

Ouro de tolo e a CABERJ

 

Por Raimundo Aben Athar

Na política, é comum alguns brasileiros possuírem políticos de estimação e, por mais que se aponte um problema aqui e ali, nada demove o cidadão de continuar adorando o seu político de estimação. Na Caberj, não é diferente, há diretores de estimação e qualquer um que ouse apontar problemas na Caberj, é logo identificado como inimigo mortal da Caberj e, claro, do diretor adorado. Há pessoas na política que usam antolhos e, portanto, não conseguem ver o óbvio. Na Caberj, não é diferente. 

Tudo do que iremos ler a seguir pode ser pesquisado, levantado e constatado por intermédio das peças contábeis e respectivas notas explicativas publicadas pela Caberj.

Não há dúvida, a Caberj foi dilapidada, vítima dos efeitos de um malfadado contrato e esta sendo reconstruída, mais por uma lupa da ANS do que por estratégia.  Os velhinhos da CABERJ estão morrendo e deixarão um legado, a CABERJ INTEGRAL, esta sim, a menina dos olhos da atual administração.

Tudo na atual administração da Caberj, desde o famigerado contrato com a prefeitura do Rio, nos apavora. Creiam, ainda há motivos para esse medo. Graças a Deus, estamos sendo guiados por regras da autoridade regulatória, a ANS, e esta condição, nos permite, no que nos resta de tempo de vida, um alento de sermos assistidos, sem sobressaltos.

A mesma administração que assinou um contrato com a prefeitura é a mesma administração que já pagou, desde 2015, aproximadamente, R$ 22,0 milhões de comissões e assessoramentos referentes a corretagem do contrato com a prefeitura do Rio. 

Fora os R$ 22,0 milhões já pagos, em 2020, a Caberj pagou, em processos judiciais e em serviços de terceiros, o valor total de R$ 33,9 milhões e há ainda mais R$ 18,0 milhões “separados” para pagamentos em datas futuras. A figura 1, abaixo, é parte da Demonstração do Fluxo de Caixa, publicado pela Caberj, e corrobora nossa argumentação

           Figura 1

                        Fonte: CABERJ

Não se iludam, em verdade, as únicas pessoas que estão pagando por isso, somos nós mesmos, posto que, nenhum dos diretores foi responsabilizado (ainda!) pelo contrato que o grupo Caberj pactuou com a prefeitura do Rio de Janeiro.

Reavivando a memória de todos nós, velhinhos da Caberj: A Caberj Integral “ganhou” o chamamento público da Prefeitura do Rio de Janeiro mas, na hora de assinar o contrato com a prefeitura, foi a Caberj, que chamo de Caberj dos velhinhos, sem alguma conotação pejorativa, é porque somos velhinhos mesmos, foi quem levou o "prêmio" daquele fatídico contrato e assumiu todas as obrigações inerentes ao mesmo, inclusive os pagamentos de vultosas comissões e assessoramentos, as quais, uma parte daqueles pagamentos, foram publicadas com o título de "Execução Provisória" nas mídias sociais recentemente, Um dos efeitos daquele contrato com a prefeitura foi a “intervenção branca” que a Caberj foi obrigada a sofrer pela ANS. Triste sina essa a nossa de Banerjianos, de sofrermos muitas intervenções em nossas vidas.

Todos nós recebemos um aviso do CODEL atual, enaltecendo a atual administração e entre loas e vivas, esqueceu o Codel e seus representantes de dizer que entre 2016 e 2017, o grupo CABERJ (Integral e Velhinhos) amargou sucessivos prejuízos, os quais, sem correção alguma,  atingem R$ 120,5 milhões. Ora, estatisticamente, é fácil dizer que, quem estava tão embaixo, qualquer pequena subida, produz um efeito estrondoso. Foi o que aconteceu. Outro motivo, em menor escala, foi o regulador permitir em 2020, algumas flexibilizações.

Qualquer melhora é bem vinda, porém, antes de apresentarmos alguns motivos para a melhora, relembremos que, para capitalizar a Caberj Integral, a Caberj dos velhinhos já repassou aproximadamente, R$ 28,0 milhões, desde 2014 (vide minhas publicações anteriores).

O principal motivo para a Caberj dos Velhinhos ter apresentado um resultado positivo de R$ 34,0 milhões é bem fácil de explicar. A figura 2 abaixo, ilustra parte da Demonstração do Resultado da Caberj dos Velhinhos, entre 2019 e 2020, notem a redução significativa das despesas médicas que saem de R$ 213,4 milhões em 2019 e atinge em 2020, R$ 177,3 milhões, portanto, uma redução significativa de quase 17%. 

A redução de despesas médicas pode ser vislumbrada, conforme figura 2, a seguir, que reproduz a DRE publicada pela Caberj:

                                       Figura 2

                                               Fonte: CABERJ
        

Notem que a redução das despesas médicas, se deu em 2020, (o primeiro ano da pandemia). Ocorre que o senso comum nos leva a crer que as internações, exames e terapias tenderiam a aumentar, não só por conta da Covid, mas porque nossa faixa etária vai aumentando e assim, mais médicos, mais internações, mais exames, mais terapias, contudo, quem de nós, em 2020, quis se operar, se internar, fazer exames, terapias, sair às ruas? Está aí, o principal motivo para os exames diminuíram 39,3%, as terapias diminuíram, 17,8% e as internações 9,7%. Estes três tipos de despesas médicas representam 88% do total das despesas médicas. Bem está explicado a redução na rubrica “eventos indenizáveis líquidos”. Nada há aqui nada que mereça louvar a diretoria da Caberj. Estávamos no "piso" e fomos ao "teto" por nós mesmos e por um efeito estatístico. Mas não é isso que diz o informe nº 7 do Codel da Caberj...

A redução das despesas médicas foi, sem dúvida, a condição indutora para o excelente resultado da Caberj e tal fato foi explorado pelo Codel, contudo, referido Codel, no informe 7, não explorou o aumento vertiginoso das despesas administrativas. Tais despesas, saíram em 2019 de R$ 47,6 milhões para R$ 74,6 milhões em 2020. Ou seja, uma variação de 56,7% no ano.  A figura 1 nos mostrou parte do caminho, a figura 3, a seguir, complementa aquele caminho.

                            Figura 3

                                          Fonte: CABERJ - Parte da DRE - 2019/2020 - Notas Explicativas

As despesas administrativas, na Demonstração do Resultado, são reconhecidas por competência e não pelo efeito Caixa, mas são substantivas e, na maior parte, referem-se ao pagamento da sentença que todos nós tomamos conhecimento nas mídias sociais. Não se iludam, há mais por vir. Claro, leiam a sentença na íntegra. O processo é público.

Sobre os R$ 18,4 milhões, há possibilidade de que seja parte do pagamento da ação judicial, porém, para os “serviços de terceiros”, que foram pagos quase R$ 27,0 milhões (figura 1), não há notas explicativas sobre este pagamento. 

Acabou?  Não, não acabou, a Caberj esperar pagar, nos próximos anos, mais de R$ 20,5 milhões. Vejamos as figuras 4 e 5:

Figura 4

       Figura 5

Aos adoradores dos “diretores de estimação”, sinto muito dizer, mas a Caberj, em 2020, não melhorou por eficácia, eficiência e efetividade de seus administradores, melhorou por nossa decisão de suspender exames, internações e terapias e por algumas regras flexibilizadas pela autoridade reguladora. Nesta ordem. O efeito foi uma redução significativa dos eventos indenizáveis líquidos, os quais, parecem não escapar da lupa da ANS. Somos uma atividade absolutamente regulada ainda sob um regime especial de administração e que, após o “tombo” com a Prefeitura do Rio, como diz a máxima popular: prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém. 

Conhecem a magistral composição (letra e música) do inesquecível Raul Seixas, chamada “Ouro de Tolo”? Pois é... As peças contábeis da CABERJ, me fizeram lembrar muito dessa música...

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Por que os spreads bancários no Brasil são tão elevados?

 

Por Raimundo Aben Athar

Sabemos que spread bancário é a diferença entre as taxas de captação (banco “pagando” para ter os recursos) e as taxas de aplicação (banco “recebendo” por usar os recursos). O spread bancário indica, de forma muito elementar, a diferença entre o preço de “compra” do dinheiro e o preço de “venda” deste mesmo dinheiro.

Uma comparação internacional feita em artigo de 2019, assinado pelos economistas Vitor Vidal, da LCA Consultores, e Marcel Balassiano, do Ibre/FGV, aponta que, ao mesmo tempo em que tem o segundo maior spread bancário do mundo (atrás apenas de Madagáscar), o Brasil está entre os piores países em termos de recuperação judicial de crédito. No Japão, por exemplo, país com o menor spread do mundo, são recuperados US$ 0,92 para cada US$ 1 emprestados. No Brasil, são recuperados, apenas US$ 0,11 para cada US$ 1 emprestado. Detalhe, a média mundial está em US$ 0,34 por US$ 1 emprestado.

Claro deve estar que essa ínfima recuperação do crédito concedido, impacta diretamente em vários custos que devem ser suportados pelos bancos, para a decisão de implementar uma operação de crédito, na condição de credor.

Uma das questões determinantes na formação dos custos para emprestar, é a estrutura de captação dos bancos e quanto eles, os bancos, estão pagando por tais estruturas, por exemplo, grandes bancos, devido á capilaridade, tendem a concentrar volumes de depósitos à vista, a prazo e de poupança muito superior aos bancos médios e pequenos. Outro fator, não menos importante, é a concentração bancária, para se ter uma ideia, os cinco maiores bancos brasileiros, por ativo, concentram 83,2% do mercado e 84,6% das operações de crédito no país[1]. A figura 1, abaixo, nos ajuda a entender o quão determinante para a formação das taxas de juros e dos spreads elevados é essa concentração bancária. Vejamos:

Figura 1

Fonte: https://insights.liga.ventures/open-banking/o-cenario-de-concentracao-bancaria-no-brasil/ Acessado em 07.05.2021

Além da concentração bancária, há vários outros motivos para os altos spreads brasileiros. Vejamos alguns:

a)        Dívida Pública Interna Alta:

·         Que incentiva a poupança financeira e desestimula a poupança produtiva;

·         Que eleva o prêmio pelo risco dos empréstimos;

b)        Níveis elevados de compulsórios:

·         Depósitos à Vista:                                      21%

·         Depósitos a Prazo:                                     31%

·         Depósitos de Poupança Livre e Rural    20%

c)         Níveis elevados de impostos:

·         PIS – 1,65%, COFINS – 7,6%

·         IR – 15% + 10%(adicional), CSSL – 9%

·         FGC = 0,025% sobre DAV, DPZO e DPOUP (Fundo Garantidor de Crédito)

d)        Créditos Direcionados

·         Financiamentos Rurais:                30% dos DAV(s)

·         Financiamentos. Imobiliários:       65% dos DPOUP(s)

·         Microcrédito:                                    2% dos DAV(s)

De acordo com o Banco Central, a diferença entre a taxa média cobrada nos empréstimos e a taxa de captação dos recursos, até out/2020, estava em 21,5pp. Vejamos a figura 2:

Figura 2

                                                      Fonte : www.bcb.gov.br – Acessado em 07.05.2021

A grande questão agora é explicar o porquê daqueles 21,5% de diferença entre as taxas de aplicação e as taxas de captação dos bancos brasileiros. Vejamos o quadro 1:

Quadro 1

Discriminação

Em proporção do spread

Custos Administrativos

0,8%

Inadimplência

41,3%

Compulsórios/Direcionamentos

2,3%

Impostos Indiretos e FGC

3,5%

Impostos diretos

20,4%

Margem de Lucro

31,7%

Total Spread

100%

Fonte: www.bcb.gov.br , www.abbc.org.br , www.febraban.org.br – sítios acessados em 07.05.2021

Em 2015, estudo da FIESP, aponta que o Brasil possuía um spread bancário 16,4 vezes maior que os seis países que usam o mesmo critério, adotado pelo Brasil, de composição para determinação do spread. A figura 3, a seguir. deixa claro a disparidade de taxas entre o Brasil e países como Itália, Nova Zelândia, Chile, Suécia, Malásia e Japão.


Há um longo caminho ainda a ser percorrido para que tenhamos um spread comparável ao primeiro mundo, porém, percebe-se claramente a redução significativa do spread bancário brasileiro entre 2015 e o ano de 2020, que diminui de 31,3 pp para 21,5pp., sem dúvida uma evolução, mas, como enfatizamos, ainda há muito a percorrer na diminuição dos impostos diretos e diretos, nos créditos direcionados, na inadimplência, na segurança jurídica para os bancos emprestarem, na concentração bancária, na definição da margem de lucro e nos recolhimentos compulsórios.

Para finalizar, vale ressaltar: A Contabilidade Bancária, é determinante para apuração e entendimento dessa importante variável da economia, que é o spread bancário.


[1] www.bcb.gov.br – Acessado em 07.05.2021