quinta-feira, 31 de outubro de 2019

O Exame de Suficiência, reflexões sobre sua necessidade


O Exame de Suficiência, reflexões sobre sua necessidade

Por Raimundo Aben Athar

A recente matéria veiculada pelo “jornal contábil” de 31.10.2019, trata de dois assuntos, ambos de suma importância para a classe contábil. O primeiro, é o assunto sobre os técnicos em contabilidade, onde questões legais para o exercício da profissão daquele profissional contábil precisam realmente de uma análise mais aprofundada. O segundo assunto, em parte dissociado do primeiro, é a necessidade de haver exame de suficiência, conforme lei 9.295/46, alterada pela lei 12.249/2010 a qual torna o exame obrigatório e define cabalmente a obrigatoriedade de prestação do exame para o exercício da profissão de Contador. Tratemos, pois somente deste segundo tema, que é a obrigatoriedade do exame de suficiência.

É uma lei e, portanto, há a presunção de ser lícita, legítima e de atender o interesse coletivo e o direito positivo. Um ato administrativo, transformado em lei, é, na verdade, uma presunção que os juristas chamam de “iuris tantum”, quer dizer, até prova em contrário.

Numa linguagem menos emproada, a questão do exame de suficiência é legal, mas pode não ser legítima, pois legitimidade é, sobretudo, aceitação social da regra, da norma, do ato administrativo. Vale lembrar: aceitação social é o estado democrático de direito em sua plenitude.

Basta “varrer” as mídias sociais de profissionais contábeis e seus grupos de conversa para se constatar a insatisfação dos profissionais e dos estudantes, relativamente ao exame de suficiência, o qual, enfatizo, por ser legal, é cobrado dos futuros Contadores nos semestres de cada ano.

Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas - INEP/MEC, desde 2015 até 2018, entre as Instituições de Ensino Superior – IES,  públicas e privadas, houve, em média, 54,7 mil concluintes por ano, na área de Ciências Contábeis. Conclui-se,  portanto, que o mercado recebeu, desde 2015 até 2018, em média quase 219,0 mil bacharéis em Ciências Contábeis. Contudo, segundo o sistema CFC/CRC(s), no mesmo período, houve uma redução de 8,3 mil profissionais, saindo de 532,0 mil profissionais registrados em 2015, para 523,8 mil profissionais em fins de 2018. Mas o que sugere tal decréscimo líquido para um número médio tão significativo de concluintes?  Como hipóteses, podemos listar:


  • Evasão por reprovação no exame de suficiência;
  • Falta de campanhas dos CRC(s) e das IES sobre a importância do               exame de suficiência e do registro para o exercício da profissão;
  • Anuidades com preços elevados que inibem o concluinte de                         buscar seu registro. aprovado ou não no exame de suficiência;
  • Novas tecnologias, plataformas digitais em escritórios contábeis;
  • Subemprego, concorrência desleal na área contábil;
  • Outros motivos como baixas, cancelamentos etc;
  • Todos os motivos reunidos.
Há outro dado, igualmente alarmante, também disponível no sítio do CFC, que dá conta de que, desde 2015.2 até 2019.1, o Exame de Suficiência reprovou, em média, 70,85% de quem fez a prova e, também em média, no mesmo período, foram 42,2 mil entre graduandos e graduados, os que fizeram a prova e, portanto, 33,3 mil foram reprovados. Realmente são dados alarmantes.


Ninguém duvida de que é o “sr. mercado” que "aplica a prova, o teste, o exame profissional" mais importante de nossas vidas. Se o tal “sr. mercado” rejeitar ou reprovar o profissional por incompetência, quais as alternativas daquele profissional? Ou ele volta aos bancos escolares e se atualiza ou procura outra profissão para ser mais competente. Simples assim.

Sou professor desde 1986 e, como profissional do mercado, desde 1973, posso assegurar que um exame, por meio de uma prova, somente prova que o aluno fez prova. Mais nada.

Enfatizando, é o “sr. mercado” que “testa” qualquer bacharel. Mostra competência? É abraçado. Não mostra? É alijado. 

Onde é preciso haver aprimoramento? No Exame? nas IES?, no mercado?

Nenhuma das respostas é simples e direta. 

Segundo o Sebrae, no Brasil, cerca de 99% das empresas são MEI(s), micros e pequenas empresas. As micros e pequenas empresas, basicamente estão no regime do simples e do lucro presumido e, também, basicamente, mais cumprem obrigações acessórias do que propriamente elaborar peças contábeis conforme o que preconiza o CPC-MPE, quase nunca os chamados "CPC(s) full". Seus Contadores devem elaborar por lei, mais por conta do Código Civil, do que por conta de leis sobre sociedades de capital aberto ou fechado, duas peças contábeis apenas: Exceção para os MEI(s), as micros e pequenas tratam apenas o Balanço Patrimonial e a Demonstração do Resultado do Exercício, nominada no Código Civil de Demonstração do Resultado Econômico.

Enfatizo que não é difícil concluir que os Contadores de pequenos escritórios de Contabilidade aplicam pouco ou quase nada de CPC(s). Desconhecem, por inaplicabilidade, o que seja “harmonização contábil”. Dirão os puristas: Que heresia isso! Pode ser, mas tais Contadores de pequenos escritórios representam, estimo, de 70% a 80% dos 520,0 mil Contadores e Técnicos registrados no CFC em outubro de 2019, sabem muito bem sobre o cumprimento de obrigações sociais e fiscais, acessórias e, claro, as principais. Entendem de IRPF e de Folha de Pagamento e, como constatação: são reféns da hiperburocracia estatal, a qual reina absoluta em nossa país. Tais Contadores "adoram" a hiperburocracia, sabe por quê? É por causa dela, a hiperburocracia, que ainda resta mercado para eles. Contudo, vejam a gravidade, as novas tecnologias estão “engolindo” os pequenos escritórios.

A classe contábil precisa refletir sobre isso. Como agir? Participando ativamente de seus conselhos profissionais, votando, se candidatando, tentando mudar o que não considera necessário, mas tudo isso com a lei, com as normas debaixo do braço. Sendo essencialmente um legalista. 

Não é subvertendo a lei que mudamos a realidade que nos aflige. É exigindo a alteração da lei, usando a única “arma” que a democracia permite que usemos: O VOTO!!!!

Na classe contábil, a cada dois anos, sempre há eleições, se você elege sempre os mesmos, é bem provável que não haja mudança alguma. Vote, se candidate, participe, use a liberdade de expressão com responsabilidade, não acuse sem provas, busque dados e COBRE do seu representante ações específicas para que possa ocorrer a mudança que você almeja. Podemos ter opiniões contrárias, mas não sejamos inimigos de quem apenas pensa diferente. Ouvir outra opinião, diferente da nossa, é fundamental para o nosso aprendizado.

No sítio do Sebrae(1) há dados sobre os pequenos negócios (MEI(s), micros e pequenas empresas) no Estado de São Paulo. Aliás, São Paulo é o estado da federação que concentra o maior números de profissionais de Contabilidade de todo o Brasil, para se ter uma ideia, em outubro de 2019, eram quase 151 mil profissionais (cerca de 30% de todos os profissionais da Contabilidade do pais) e 21 mil organizações contábeis. Em São Paulo, 98% das empresas ativas são caracterizadas ou como MEIs, ou como micros, ou como pequenas empresas.

Podemos estender estes números de empresas para todo o Brasil. 

Assim, nos resta inferir:
    • Se a maioria dos Contadores está em pequenos escritórios                   contábeis,
    • Se os pequenos escritórios contábeis concentram MEI(s),                     micros e pequenas Empresas,
    • Se, segundo o Sebrae, o maior número de empresas são                    MEI(s), micros e pequenas;
    • Se sabemos que nos escritórios de Contabilidade se pratica                mais cumprimento de rotinas sobre obrigações sociais, fiscais e           folha de pagamento do que propriamente a Contabilidade;
    • Se o exame de suficiência captura mais conhecimento em                   lançamentos e pronunciamentos contábeis;
    • Se as IES preparam seus graduandos sem considerar a                      realidade de que micros e pequenos negócios “usam” pouco a             Contabilidade e mais tecnologia para transmitir informações aos          governos.

Podemos concluir que a empregabilidade do Contador depende mais de conhecer como cumprir obrigações principais e acessórias do que propriamente conhecer sobre os quase 50 pronunciamentos contábeis, fora interpretações e orientações técnicas. É um raciocínio bem simples, quando usamos os números que estão à disposição: De 5 prováveis empregos na área contábil e que exigem o registro, 4 poderão estar nos escritórios de Contabilidade


Por que os sindicatos perderam força? Porque a contribuição não é mais obrigatória e, quando deixou de ser obrigatória, a percepção de valor por parte do sindicalizado deixou de existir. Isso pode acontecer na área contábil? Claro que sim.

Por outro lado, há, de 20% a 30% de profissionais de Contabilidade que são Auditores, Peritos, Consultores, Contadores de médias e grandes empresas, Contadores da área pública, do mercado financeiro, enfim, estes profissionais, se não estiverem atualizados nos pronunciamentos contábeis, todos transformados em Normas Brasileira de Contabilidade, as NBC(s), estão realmente fora do mercado.

Vejam então que é preciso mesmo encontrar um ordenamento que permita atender a todos os anseios, TODOS os profissionais que vivem da Contabilidade precisam de um norte.

A realidade é que há muito por fazer, todas as transformações na área contábil, que estão a ocorrer, praticamente ao mesmo tempo, tais como, novas tecnologias, novas plataformas digitais, inteligências artificiais, as IFRS vistas como fantasmas, a PEC 108, a economia desandada, principalmente aqui no Rio de Janeiro, o único Estado da federação a não ter criação de empregos em 2019 (até outubro). Tudo isso junto, dá um profundo desânimo e a reação é jogar a culpa no sistema CFC/CRC, nos governos em todas as esferas, federal, estadual e municipal. Mas quem elege os dirigentes? 

Viu? É a democracia com nossa participação que resolve isso.

Não há dúvida, precisamos de encaminhamentos, de propostas de solução, de alternativas para este novo tempo que já chegou.















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