Conselhos
Profissionais:
Esqueçam a PEC
108, o TCU é o que importa.
Por Raimundo Aben Athar
Introdução
Desde o anúncio da PEC 108/2019,
a internet foi pontilhada de manifestações de apoio por parte dos profissionais
das 68 profissões regulamentadas deste país. A proposta foi muito bem-vinda pela
imensa maioria dos profissionais que exercem profissões, tais como contadores, advogados,
médicos, dentistas, engenheiros e vários outros profissionais de profissões
regulamentadas.
Já os dirigentes dos
conselhos, em sua maioria, se manifestaram absolutamente contra a PEC 108, é
claro, alegando defesa da importância e da necessidade de existência das
respectivas corporações com o formato atual para as quais foram eleitos na forma da legislação vigente.
A maioria dos profissionais de
profissões regulamentadas, são obrigados a se cadastrarem no respectivo
conselho profissional e a pagar uma espécie de tributo, chamado de anuidade. Aludem aqueles profissionais que há aparelhamento político, anuidades elevadas e o portal
de transparência, quando existe, não contém informações suficientes para se
verificar como estão sendo realmente aplicados os recursos arrecadados.
Em 17.07.2019, cumprindo a liturgia de um
tribunal de contas, o ministro Weder de Oliveira, na plenária do Tribunal de
Contas da União - TCU[1], em plenário, repete exatamente os argumentos que
os profissionais de profissões regulamentadas usaram para entender a PEC/108
como muito bem-vinda. Naquele pleno de 19.07.2019, o ministro Weder, expôs de forma
cristalina uma sucessão de mazelas praticadas pelos conselhos de profissões
regulamentadas que vão desde ineficiência, até corrupção, passando por uso dos
conselhos para palco de ambições políticas, nepotismo etc. Vejam o vídeo (link em
nota de rodapé) e tirem suas conclusões.
Importante não esquecerem que
é um ministro do Tribunal de Contas da União que, em plenário, está proferindo
um discurso, que se transformará em acordão com base em relatórios de auditoria de conformidade. O vídeo absolutamente
não é um discurso político e, portanto, é bastante esclarecedor.
Creio, sinceramente que não
será a PEC/108 o maior “problema” dos dirigentes, que defendem o "status quo"
atual dos Conselhos, os quais, em profusão, desandaram a postar, nas redes
sociais principalmente, argumentos sobre a “manutenção do poder de polícia” e
sobre a “missão dos conselhos no que concerne à defesa da sociedade de maus
profissionais”.
Assim, o lobby das
corporações, capitaneadas pela maior delas – a OAB, “colocou seu exército na rua”,
quer dizer no Congresso.
A meu sentir, da forma atual
como está redigida, chance zero de a PEC/108 ser aprovada no parlamento
brasileiro. Ocorrerão muitas modificações, muitas.
Façam as contas: Para uma PEC
ser aprovada são necessários 3/5 do Congresso, isso dá 308 deputados, quase
todos profissionais de profissões regulamentadas, advogados em maioria, logo,
enfatizo, chance zero de aprovação da PEC/108. Muito lobby, muitas
corporações agindo, influindo e infundindo os argumentos favoráveis à
manutenção de conselhos como autarquias especiais ou autarquias paraestatais.
Enquanto a PEC/108 não vem, o
TCU está aí, acordado, cumprindo sua função constitucional, com a lei debaixo
do braço e a caneta à mão, produzindo relatórios, acórdãos e decisões, as quais
alcançarão, em algum momento os conselhos profissionais, que não estiverem
seguindo os manuais, as regras, as leis, etc
Há duas questões que pretendo
aqui enfatizar, ambas foram mencionadas pelo ministro Weder de Oliveira na
recente plenária de 17.07.2019.
Sem mencionar quais conselhos
se referia o ministro, na mencionada plenária, enfatizou, entre outras
questões: o excesso de aplicações
financeiras e despesas com pessoal em Conselhos.
Todos os dados que serão
demonstrados a seguir, referem-se ao sistema CFC/CRC(s) e foram obtidos dos
seis CRC(s) que mais arrecadam anuidades no sistema. São dados públicos e disponíveis nos respectivos portais da transparência de cada CRC e do CFC.
Os valores médios, quando usamos os 27 CRC(s), para qualquer item orçamentário, apresentam desvios muito elevados, motivados certamente pelas significativas amplitudes e dispersões entre os valores de receitas e de despesas de todo o universo pesquisado (27 conselhos regionais).
Por exemplo, as receitas financeiras do CRC de Roraima, em 2018, foram de R$ 34,0 mil. O CRC de São Paulo contabilizou receitas financeiras, no mesmo ano de 2018, no total de R$ 5,2 milhões. Assim, optamos por apresentar os valores médios de receitas financeiras, aplicações financeiras e despesas com pessoal dos 06 maiores arrecadadores.
Os valores médios, quando usamos os 27 CRC(s), para qualquer item orçamentário, apresentam desvios muito elevados, motivados certamente pelas significativas amplitudes e dispersões entre os valores de receitas e de despesas de todo o universo pesquisado (27 conselhos regionais).
Por exemplo, as receitas financeiras do CRC de Roraima, em 2018, foram de R$ 34,0 mil. O CRC de São Paulo contabilizou receitas financeiras, no mesmo ano de 2018, no total de R$ 5,2 milhões. Assim, optamos por apresentar os valores médios de receitas financeiras, aplicações financeiras e despesas com pessoal dos 06 maiores arrecadadores.
Seis conselhos regionais do
Brasil concentram 70% da arrecadação total do sistema CFC/CRC(s). São eles: Rio
de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa
Catarina. Estes seis estados executaram em 2018, receitas correntes
(basicamente arrecadação de anuidades e anuidades em atraso) em cerca de R$
193,0 milhões, de um total arrecadado pelo sistema, nos 27 CRC(s) de R$ 284,0
milhões. Deste total de arrecadação, 20% são imediatamente remetidos para o CFC
e ainda, para os seis maiores CRC(s) em arrecadação, há o adicional de 1%,
calculado sobre o total das receitas orçamentárias para a formação de um fundo
de integração, conhecido como Fides.
Aplicações financeiras médias
O sistema CFC/CRC, como qualquer entidade, pública
ou privada, aplica recursos no mercado financeiro. Porém, talvez o faça de
forma extremamente conservadora, posto que as receitas financeiras, que
deveriam ser residuais, representaram em média, no ano de 2018, 6,16% das
receitas correntes realizadas. Não é pouca coisa, estamos falando de quase R$
12,0 milhões de receitas financeiras nos seis CRC(s) mencionados, cujos valores, é óbvio, não foram
destinados à classe contábil e sim ao mercado financeiro. Mas porque
“sobram” recursos para serem aplicados? É relativamente simples provar tal condição: receitas correntes executadas
maiores que despesas correntes liquidadas e pagas. Como este fato acontece há
vários anos é evidente que tais “sobras”, capitalizadas, se avolumam e se
elevam exponencialmente. Efetivamente teremos valores expressivos que serão
entesourados e, portanto, não aplicados com a classe.
O “fenômeno”, entendido de outra forma, pode ser
definido como despesas fixadas com elevadas “gorduras”, as quais, proporcionam receitas
previstas de igual valor. Se a execução da receita é recorrentemente maior, a consequência é haver recursos não direcionados, porquanto superestimados na fixação, que serão
destinados ao mercado financeiro.
Há defensores desta situação, os quais, alegam
vários motivos para manutenção do “excesso de gordura”, motivos estes que vão
desde possíveis ações trabalhistas, à necessidade de obras estruturais nos
prédios próprios, passando por outras contingências do custeio. Sem dúvida, a
classe contábil precisa discutir este assunto em cada conselho regional e no
conselho federal.
O fato é que, da mesma forma que as despesas com pessoal,
o assunto excesso de aplicações financeiras, é, podemos afirmar, um tabu, pois
não é discutido e, acredito, não suficientemente entendido pelos mais de meio milhão de
profissionais da contabilidade. Vale registrar que o CFC, com seus 20%
obrigatórios, de 27 CRC(s) e mais 1% de 6 CRC(s), ao longo vários anos, transfere parte
daqueles recursos "tomados" dos CRC(s) para os próprios CRC(s), via transferências de
capital, transferências correntes e empréstimos. Os motivos para a devolução são diversos, mas principalmente, complemento ao custeios e empréstimos para obras e/ou inversões. O CFC cobra juros dos
empréstimos (não pretendemos aqui entrar no mérito da proibição expressa na lei de responsabilidade
fiscal para empréstimos entre autarquias).
Em 2018 houve Empréstimos de R$ 8,8 milhões (R$ 6,0
milhões somente para o Rio Grande do Sul), R$ 2,0 milhões em transferências de
capital (ajuda no custeio e sem devolução – uma espécie de “fundo perdido”) e
R$ 6,3 milhões em transferências correntes (em grande parte apenas devolução
dos gastos com exame de suficiência). Por enquanto, deixemos o “socorro” aos CRC(s) para
outra discussão. Voltemos às aplicações financeiras.
Quando os CRC(s) e CFC aplicam suas sobras de
recursos, os juros obtidos (receitas financeiras), passam a fazer parte do
orçamento. No caso em tela, em percentuais significativos. No CFC, em média, nos doze meses do
ano de 2018, as aplicações financeiras mensais alcançaram o valor médio de
R$ 102,1 milhões. Isso mesmo, R$ 102,1 milhões/mês. É simples fazer esta
conta: vá ao portal da transparência, veja o total da receita financeira anual,
no caso de CFC, em 2018, foram R$ 6,2 milhões de receitas financeiras
reconhecidas contabilmente. Ora, sabemos que 100% CDI médio de 2018 (parâmetro
para aferição de performance no mercado financeiro) foi de 6,42%aa. Agora, sem
precisar consultar 12 meses de aplicações financeiras, considere que os CRC(s)
obtiveram no mínimo 95% da taxa CDI (o que é muito normal em aplicações de
baixo risco), o que dá uma remuneração de 6,099%aa em média. Pronto, dessa
forma, se obtém o valor médio das aplicações financeiras. Vejamos na prática:
- Taxa média do CDI: 6,42%aa
- 95% da taxa média do CDI (performance mínima): 6,099%aa
- Receita financeira do CFC: R$ 6.226,9 milhões
- A questão: Qual o valor aplicado que produz juros de R$ 6.226,9 milhões?
- Resposta: R$ 6.226,9 / 0,06099 = R$ 102,1 milhões.
O quadro 1, a seguir, indica quanto cada um dos
seis maiores CRC(s) e CFC aplicaram de recursos, em média mensal, no ano de
2018. As receitas financeiras apresentadas no quadro 1 são anuais e representam
a remuneração pelas aplicações.
Quadro 1
Despesas com pessoal nos seis maiores CRC(s)
As despesas com pessoal, com
todos os encargos, quando comparadas com o total das receitas correntes;
diminuídas dos repasses ao CFC (cota-parte + Fides) e das receitas financeiras,
posto que receita financeira é algo que deva existir de forma residual apenas
para suportar as oscilações do caixa mínimo operacional; atingiram em 2018 a
média, de 60,9%. Em 2018, foram pagos a
578 colaboradores, nos seis maiores CRC(s), R$ 117,5 milhões, o que proporciona
um total médio de despesas com pessoal da ordem de R$ 16.940,60/mês por cada
funcionário/colaborador.
O quadro 2, a seguir, aponta a
razão (quociente) entre as despesas com pessoal e as receitas correntes,
diminuídas dos repasses ao CFC e das receitas financeiras. Chamamos a esta
razão (quociente) de Receita Corrente Líquida para os CRC(s) – RCL-CRC.
É dada pela seguinte fórmula:
{Despesa com Pessoal / [Receita Corrente – (cota parte + Fides + receita
financeira)]}.
Quadro 2
Quadro 2
Observem que, na média, nos seis maiores CRC(s) em
arrecadação, consumiram em despesas com pessoal em 2018, 60,9% da Receita Corrente Líquida dos CRC(s).
No CRCRS (Rio Grande do Sul), 64,5%. Desta forma, fácil concluir que somente 39% “sobram” em média, para fiscalização, educação continuada, outros custeios, diárias, passagens, auxílios etc.
No CRCRS (Rio Grande do Sul), 64,5%. Desta forma, fácil concluir que somente 39% “sobram” em média, para fiscalização, educação continuada, outros custeios, diárias, passagens, auxílios etc.
Realmente
estes dois assuntos precisam estar na pauta de qualquer reunião da classe. São
assuntos interdependentes e interagentes e absolutamente não são de fácil
solução. O TCU certamente se manifestará sobre estes e outros fatos.
A classe
contábil precisa se fazer presente com discussões técnicas que satisfaça aos
anseios de todas as partes envolvidas. Observem que discussões técnicas são
diferentes de discussões vãs que agridem a honra das pessoas e sujeitam os
agressores às penas da lei, como é comum vermos nas mídias sociais. Se toda a classe participar com técnica e
argumentos, mesmo que divergentes mas respeitosos uns com os outros, ganhamos todos. Afinal
estamos todos no “mesmo barco”
Finalmente,
quem elege os conselheiros é a classe contábil, não adianta votar em branco ou
anular o voto, uma chapa irá se eleger e pode ser que você não esteja alinhado
com aqueles pensamentos.
“Ninguém
pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a
democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido
experimentadas de tempos em tempos.” [Sir Winston Churchill].
Vamos! Novembro
de 2019 está aí mesmo, faça o líder da sua chapa, que irá renovar 1/3 do
plenário dos CRC(s) se comprometer com mudanças, se assim você o desejar ou
deixe tudo como está, se assim também for sua preferência, porém precisará aguardar PEC(s) e TCU(s).